domingo, 22 de setembro de 2019

Capítulo IV : A Formação do Grupo

"Para estar junto não é preciso estar perto, e sim do lado de dentro."
(Leonardo da Vinci))

              Meus caros leitores, a curiosidade é, sem sobra de dúvida, aquilo que nos move enquanto seres humanos e, com certeza, foi ela quem nos levou a evolução, falo isso em relação ao pensamento e a tecnologia, mas, quando direciono tal comportamento às mulheres, não sei se tenho certeza, porém acredito que ele é potencializado de forma incrível, por isso quero dizer que nossa heroína teve uma noite irrequieta. Andou durante a noite e madrugada inteira com a cabeça a pensar em inúmeras perguntas que poderia ter feito e não as fez. Presumo, meus amigos leitores, que já tenham passado por isso, pois todos nós já entramos em querelas e falamos o quê nos veio  à cabeça, contudo, depois de apaziguada a controvérsia, pensamos em tudo aquilo que poderíamos ter falado e não falos, esse comportamento nos irrita e nos tira o sono, pois bem, era assim que se encontrava Valentina, porque uma conversa foi iniciada e não concluída, graças a minha entrada, e porque ainda tinha questões a serem esclarecidas. A noite parecia uma vida inteira, contudo, mesmo demorando a passar, a manhã do dia seguinte chegou.
             O relógio marcava seis horas da manhã, Valentina, que amava dormir,  já havia, àquela hora, enviado inúmeras mensagens para o whatsapp do Enzo querendo saber que horas ele chegaria, contudo, até ali não recebera nenhuma resposta, o que aumentava ainda mais sua ansiedade. Já cansada de esperar, decidiu por ligar para seu primo.
             - Bom dia, Enzo!
             - Valentina, que horas são?
             - São seis e quinze.
             - Logo você acordada às seis e quinze, no primeiro dia de férias!
             - Pois é!
             - Está bem?
             - Nem um pouco, não dormi a noite inteira.
             - Nossa, deve estar com o humor dos deuses.
             - Não estou mal humorada, estou com muitas ideias na cabeça, ansiosa e cansada.
             - Já eu estou com sono, muito sono.
             - Que horas seu pai vai trazer vocês?
             - Vamos sair em vinte minutos.
             - O que faz deitado ainda?
             - Valentina, dormi arrumado, preciso de cinco minutos para escovar os dentes , porque vou comendo no carro.
            - E a Victória?
            - Deve ter acordado às cinco da manhã para se arrumar. Por que?
            - Por nada, levanta e não sai do celular, preciso falar.
            - Jesus!!
            - Para de reclamar.
            - Vou fazer um grupo no whats, porque se eu não responder a Victória ou o Gabriel respondem.
            - O Biel vem com vocês?
            - Vai sim.
            - Ele não ia para casa da avó.
            - Sim, mas ele vai no próximo fim de semana.
            - Enzo, levanta, o pai está te chamando, só falta você.
            - Já vou, Victória.
            - Levanta, logo!
            - Já levantei, Biel. Valentina, vou nessa, chegamos em trinta minutos, afinal de contas é madrugada de sábado.
           - Você conversou com seus irmãos sobre ontem?
           - Eles sabem o quê meu pai falou, eu não disse nada.
           - Conversamos aqui, então, melhor falar tudo pessoalmente.
            - Tá bom, até daqui a pouco.
           No tempo cronológico, a viagem durou quarenta e cinco minutos, entretanto, para a Valentina, o tempo arratou-se como uma lesma sem pressa de chegar a lugar algum, contudo, mais uma vez, a casa fora agitada pelo soar da campainha, tenho uma teoria, amigo leitor, sobre a quebra do silêncio causado pela campainha, mas isso é assunto para um capítulo e deixarei para outro momento. Nossa querida adolescente, passou correndo pela sala e gritou:
             - Pai, deixa que eu atendo!
             - Tudo bem, deve ser seu tio.
             - Sim, são eles.
             - Oi, tio!
             - Oi, chorona! Cadê o chato do seu pai?
             - Está na cozinha, pode ir lá.
             - Já vocês, venham comigo.
             - Nossa, você está bem Valentina?
             - Não, Vi, mas vou contar tudo.
             A conversa transcorreu por mais de sete horas, nunca os vi por tanto tempo quietos sem um brigar com o outro, afinal de contas, são primos. Mas tudo aquilo viria por acabar com a visita já esperada.
             - Boa tarde, a senhora deve ser a professora?
             - Sim, prazer, Nix!
             - O prazer é meu, Naime.
             - Vim saber se a pequena está melhor.
             - Ela está bem sim, mas entre, por favor, vou chamá-la.
             - Valentina, sua professora!
             Como um furacão todos entram na sala, uns curiosos para ver aquela figura sinistra que ouviram falar durante as longas horas de conversa, outros curiosos e desesperados por informações.
             - Calma, meninos, olhem a educação!
             - Desculpa, Naime!
             - Tudo bem, Biel! Ainda bem que veio.
             - Obrigado!
             - Mãe, tem suco?
             - Vou fazer um soco pra vocês.
             - Obrigado, mãe!
             - Você está bem, Valentina?
              - Não, professora, não dormi à noite!
             - Aí meus Deus, de novo essa conversa.
             - Calma, Enzo!
             - Victória, eu já tinha ouvido uma primeira vez e fui obrigado a ouvir tudo de novo com vocês.
             - Você deitou e dormiu.
             -  Nossa, que irmã, eu não dormi, descansei as meninas?
             - Que meninas, menino?
             - As dos olhos, Biel.
             - Prô, tenho muitas perguntas?
             - Vamos devagar, faça-as, mas não sei se consigo responder.
             - De onde conhece a professora Métis? Que livro é aquele? Por que ficou no lugar dela? O que aconteceu quando toquei o livro?
             - Eita, desembestou a perguntar.
             - Preciso de respostas, Enzo.
             - Vou responder, mas fico feliz que já tenha montado uma equipe, precisaremos.
             - Como assim precisaremos, estou de férias.
             - Para, Enzo.
             - Para você, Valentina.
             - Prô, fala, estou angustiada, preciso muito saber.
             - Tudo bem, mas a história é longa e acho que aqui não é o melhor lugar.
             - Sim, já já minha mãe aparece e corta o assunto, precisamos combinar em algum lugar, mas hoje, não aguentarei mais uma noite sem dormir.
             - Pode ser na casa da Métis.
             - Prô, a senhora tem a chave?
             - Tenho sim, Enzo.
             - Mas, por que tem a chave da casa dela?
             - Conto lá, menino curioso!
             - Deus me livre, nem te conheço! 
             - Menino!!!
             - Verdade, Biel, ela roubou as aulas e a casa, estranho, não?
             - Tudo até agora é estranho.
             - Sim, Biel, por isso acho a ideia ruim.
             - Tenho que concordar com ele.
             - Vi, confie em mim, eu cuido, como sempre, de vocês.
             - Tá bom, Biel.
             - Um protetor, excelente.
             - Cheguei com bolo e suco, pessoal!
             - Obrigada, só queria saber como a pequena estava, como vi que está bem, já vou.
             - Tudo bem!
              - Mãe, vou acompanhá-la até à porta.
             - Tudo bem, Valentina.
             - Já eu, vou comer.
             - Também vou, Enzo.
             - Então, Vamos Bi!
             Depois de comerem e de se organizarem, afinal de contas agora estava formada a equipe para descobrir o que aconteceu, os meninos saíram e direcionaram para casa da Métis, pois há muitas questões a serem respondidas.
               
            
            


quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Capítulo III - Novas amizades

"Quem cedo e bem aprende, tarde ou nunca esquece. Quem negligencia as manifestações de amizade, acaba por perder esse sentimento."
(William Shakespeare)
              Na sala, reunidos, a conversa não transcorria com naturalidade, a professora buscava, com uma simpatia forçosa, informações sobre como Valentina estava ou se se sentia diferente. As perguntas inquietavam nossa heroína, pois respondia, incansavelmente, aquele questionamento que já fora feito, durante aquele colóquio, inúmeras vezes. Então, na tentativa de dar mais harmonia a conversa, decidir por trazer um aperitivo, afinal de contas, comer sempre alegra as pessoas.                 - Vou trazer algo para comermos.                 - Não precisa, senhor, logo irei.                 - Eu estou morrendo de fome.                 - Nossa, Enzo, você só pensa em comida.                 - Lógico, Valentina, preciso manter minha beleza e busco as vitaminas para ser lindo no que como.                 - É, você com fome ninguém merece!                 - Então, vou lá e já retorno.                 - Tá bom, pai.                Ao retirar-me da sala, a professora teve um brio de alegria, logo, era eu o fato de a conversa não fluir, então, Nix direcionou-se para Valentina e agora já desinibida falou:                 - Mocinha, sei que algo aconteceu, mas não sei explicar e você precisa me contar.                 - Professora, como a senhora muda rápido de humor.                 - É de dar medo.                 - Enzo, você tem medo de tudo.                 - Mas isso não é normal.                 - Ele tem medo de tudo? Foi por isso que correu de mim?                 - Não, sai porque precisava cuidar da minha prima.                - Para de ser mentiroso, correu com medo sim.                - Não se pode querer ajudar que é mal interpretado.                - Desculpe, mas tive a impressão de medo mesmo.                - Não foi impressão, foi medo mesmo.                - Tudo bem, tive um pouco de receio, isso é normal.                - Ser medroso como você não é normal!                - Normal é falar com barata.                - Como assim falar com barata?                - Eita, falei demais!                - Como sempre, bocão.                - Vocês precisam ser sinceros comigo.                - Difícil, você não tem uma aparência confiável.               - Enzo!               - Pronto, falei.              - Por que não sou uma pessoal confiável?              - Professora, sua aparência é de dar receio, ouviram bem, né, receio.              - Não entendi.              - Veja, a senhora tem, desculpe a comparação, a pele mais branca que um palmito e os cabelos mais negros que "as asas da graúna".              - Enzo do céu, você consegue usar palmito e Iracema no mesmo texto.              - Pois é, literatura corre nas minhas veias, tenho um dom único.              - Não entendo como minha aparência pode gerar desconfiança.              - Senhora Nix, o Enzo só está falando besteira hoje, desconsidera, por favor.              - Mas tenho certa razão, é um esteriótipo daquelas bruxas da Idade Média.              - Menos, menino, para com isso, está deixando a professora sem graça.              - Bem que você concordou comigo quando falei a primeira vez.             - Mas agora nos conhecendo melhor, acho que fui precipitada.             - Fico feliz, pois tentei falar com seu primo para tentar estabelecer um laço de amizade e ele saiu correndo do nada.             - Ele é assim mesmo, a senhora precisa ver o quê aguento.             - Vocês sabem que estou aqui, né?             - Sim, sabemos.             - Pois não parece, fica a dica.             - Mas professora, o motivo de a senhora não nos passar segurança, no primeiro momento, foi porque veio à escola substituir a melhor professora de todas, então fiquei chateada.              - Aí, ela viu seu livro estranho e concordando comigo que a senhora tinha uma aparência suspeita, decidiu pegá -lo.                - Então, o livro não é meu, meninos.                - De quem é, professora?                - Então, o livro é da Métis.                - Eita, não entendi nada e você Valentina?                - Também não.                - Como somos amigos, vou contar, meninos, mas é algo muito estranho.                - Tudo com vocês é estranho, posso me retirar?                - Você não está curioso, Enzo?                - Estou, mas olha onde sua curiosidade nos trouxe, vou me privar de mais problemas.                - É sério isso?                - É, vai que piora.                - Meninos, acho que poderão me ajudar.               - Conta, Nix, e você senta aí Enzo!               - Então, vamos lá.               - Nossa, estou muito curiosa.               - Era ontem, as 22 horas, meu telefone tocou, era a Métis.               Nesse momento, voltei a sala com os aperitivos e sucos, mas aquela conversa intensa que da cozinha eu ouvia como murmúrios indecifráveis, agora dera lugar a um silêncio comparado à Câmara de Ecos no laboratório de Orfield em Minneapolis.                 - Voltei, pessoal!                 - Senhor, agradeço a gentileza, mas tenho que ir, já está tarde.                 - Não acredito, nem provará dos meus aperitivos.                 `- É, Nix, fique mais um pouco.                  - Tenho que ir, Valentina, mas retornarei para saber como está.                  - Ufa, não ouvi a conversa.                  - Que conversa?                  - Nenhuma, pai.                  - Licença, retorno amanhã para vê se melhorou.                  - Já que não quer provar do aperitivos, professora, vou acompanhá-la à porta.                  - Obrigado pela cordialidade e gentileza de vocês.                  - Tchau, Nix, até amanhã.                  - Até amanhã, meninos.                 - Até, professora.                 Nos direcionamos à porta, enquanto isso, Enzo devorava os queijos, salame e tomava todo o suco.                 - Divide, Enzo!                 - Pode comer, amiguinha da Nix.                 - Gostei dela.                 - Gostei foi da conversa não ter continuado.                 - Mas trate de vir amanhã cedo, não sabemos que horas ela virá.                 - Não sei se meu pai vai querer me trazer.                 - Pode deixar que eu peço ao tio Victor.                 - Meninos, não gostei dessa professora, veio toda estranha, falava pouco e rejeitou meu petisco.                 - Tio, salame, queijo e suco não são algo coisas extraordinárias.                 - Mas bem que você está acabando com tudo.                 - Pai, a professora é legal , mas acho que ela é vegana e não quis ofender.                  - Eu achei foi bom, porque assim sobra mais.                  - Se vier amanhã, não faço nada.                  - Tá bom, pai.                  - Tio, meu pai disse que horas viria.                 - Não, manda uma mensagem para ele.                 - Minha internet não funciona aqui, tio.                 - Tá bom, mando do meu celular.                  Tocaram a campainha e novamente a ansiedade tomou conta da nossa pequena.                  - Será que a professora esqueceu alguma coisa?                  - Veio comer, óbvio.                  - Enzo, você é engraçado.                  Fui à porta e deparei-me com meu irmão com aquela cara sisuda à minha frente.                 - Cadê o Enzo?                 - Boa tarde! Mal educado!                 - Boa tarde!                 - Tá frio e você vem com boa tarde.                - Chato como sempre.                - Estou com pressa, Ju, a Cinthya está esperando buscá-la no metrô .                - Vou nessa, Valentina, amanhã nos falamos.                - Tio, traz o Enzo amanhã de novo.                - Trago, sim, ele e a Victória, vou deixá -los uns dias aqui durante as férias.                 - Traz o Biel também.                - O Biel vai estar na casa da avó.                - Está bom, então, até amanhã.                - Até amanhã.                                  

quinta-feira, 5 de setembro de 2019

Capítulo II : A mudança


  "Toda reforma interior e toda mudança para melhor dependem exclusivamente da aplicação do nosso próprio esforço."
(Immanuel Kant)

               No carro, seguimos os três em direção ao hospital, nossa heroína não se cansava de afirmar que estava bem e que aquilo não havia necessidade, contudo, sua linda fisionomia descrevia algo adverso as suas falas, seu rosto, sempre branco, com seus olhos azuis, cabelo e sorriso contagiante e pueril, salvo guardo pelas manhãs, como vocês também já o sabem, caros leitores, fora substituído por uma face ruborizada, um olhar oblíquo e um sorriso esmaecido, não sei o quê acontecera com a pequena, contudo, tinha a esperança que um médico resolve-se aquilo o mais rápido possível.
              Enquanto isso, no carro, Valentina, que afirmava sentir-se bem, conversava com seu primo, o qual não parava de fazer perguntas:
                  - O que aconteceu, me explica, não entendi nada.
                  - Não sei, toquei no livro e senti algo estranho, de repente, choquei-me contra a parede, é a única lembrança que tenho.
                 - Meu, como não lembra de nada?
                 - Não lembrando, Enzo, mas estou bem.
                 - Não é o que parece, precisa se ver.
                 - Juro que me sinto bem!
                 - Seu conceito de bem precisa, urgentemente, ser reformulado.
              - Nossa, você falando assim, parece que estou um trapo, mas não me sinto assim.
                 - Vou tirar uma selfie nossa  pra você ver.
                 - Tá bom!
                 - Nossa, você me deu choque,  está parecendo um peixe-elétrico!
                 - Isso é estática, estática, Enzo. Viu o que dá não estudar?
                - Estudo tanto que sou capaz de explicar.
                - Ah é!? Então explica.
                - Minha cara aluna, estática é, na física,  o ramo da mecânica que estuda as propriedades de corpos que estão em equilíbrio quando sob a ação de forças. 
                 - Falou, falou e não disse nada.
                 - Elementar minha criança, no caso em questão, em que toquei você, o que ocorreu foi um desequilíbrio entre as cargas..
                  - Porque essa voz besta?.
                  - Não me interrompa, criança, ainda tem uma curiosidade, pois gosto das coisas nos mínimos detalhes, a eletricidade estática entre as pessoas é mais comum em dias secos.
                - Obrigado, Sherlock Holmes!
                - Tonta, que Holmes o que, eu estava imitando o tio, você nunca ouviu seu pai falando? Choro de rir.
                - Esse meu sobrinho é inteligente, e, hoje, Valentina, não está um dia seco.
                - Tio, para professor de física, o senhor é um grande historiador.
                - Pai, não me faça passar vergonha, os dias frios, por causa da baixa umidade, são mais secos.
                - Vamos tirar a selfie antes que você melhore e eu não registre essa cara horrível para eternidade.
                  - Meninos, até nessas horas vocês tiram fotos para postar nas redes sociais.
                 - Não tio, é para mostra a Valentina como ela está linda.
                 - Obrigado pelo falso elogio, Enzo, vai ajudar muito com minha autoestima, depois do "cara horrível".
                 - Minha mãe sempre me fala: "Enzo, sua sinceridade é linda!"
                - Já sei de quem legou o sarcasmo.
                - Meninos, chegamos, vamos lá.
                - Enzo, vou te contar um segredo, não me sinto doente ou com dor, mas me sinto diferente, só não queria que meu pai soubesse.
                - Diferente como?
                - Não sei explicar, mas sei que mudei.
                - Espero que essa cara não fique para sempre, porque a da Nix me assusta, mas é linda, esse não é seu caso.
                 - Obrigado, Enzo!
                 - Por que estão demorando para sair, aconteceu alguma coisa?
                 - Já estamos saindo, tio.
                 Ao entrarmos no saguão do hospital, o sorriso de outrora coletivo, agora dera lugar ao desanimo, porque era impossível ver o fim da fila e os rostos das pessoas, que ali estavam, aumentavam a ideia de que ficaríamos ali por um bom tempo. Algumas horas depois, fomos atendidos, o médico, um jovem de mais ou menos 30 anos, examinou Valentina e, em cinco minutos de observação, classificou o caso como sendo uma virose e prescreveu, para tratamento por 7 dias,  Amoxicilina. Deixamos o hospital e fomos para casa.
                - Tio, o senhor não acha estranho prescrever Amoxicilina se é uma virose?
                - Pai, eu não vou tomar antibiótico!
                - O médico falou que vai te ajudar, Valentina.
                - Tio, como um antibiótico vai ajudar numa virose?
                - Não sei.
                - Nem o senhor nem ninguém.
                - Vamos para casa, lá falamos com sua mãe.
                Ao chegar em casa, apesar de estar conversando normalmente com seu primo e pai, Valentina, com o seu olhar distante, estava, na verdade, em um momento de introspecção e aplicando todo seu esforço para entender as mudanças pelas quais passava.
               - Pai, estou com dor de cabeça, vou para o quarto um pouco.
               - Aí  meu Deus, Valentina, quer tomar o remédio?
               - Não pai, valeu!
               - Está bem filha, descanse um pouco, vou tentar falar com sua mãe, ela ainda não sabe do ocorrido.
               - E eu, vou ficar aqui sozinho? Meu pai vai demorar um pouco para chegar.
               - Vem comigo, Enzo, quero falar com você.
               -  Tá bom!
               No quarto, Valentina primeiro verificou se eu não estava próximo, encostou a porta, chamou o Enzo à mesinha de estudos, escreveu no papel e pediu que lesse em silêncio. Lá estava escrita a seguinte frase: Você consegue ouvir esse monte de vozes?
               Enzo, não conseguiu controlar seu impeto de fazer piada com tudo e soltou:
               - Ouço.
               - Sério?
               - O tempo todo.
               - Estou falando sério!
               - Óbvio que não, não sou sensitivo.
               - Para, Enzo, é sério meu!
               - Tá bom, mas é engraçado! De onde vem as vozes?
        - Aí está, não sei, não tem ninguém aqui, mas estou ouvindo duas pessoas conversando.
                  - Saí pra lá, não vou ficar aqui com você, está me dando mais medo que a Nix.
                  - Preciso que você me ajude a atender.
                  - Vamos pesquisar na internet, lá tem tudo.
                  - Vamos!
                  - Minha internet está horrível e seu wi-fi não ajuda muito.
                  - Então vamos pesquisar no computador.
                  - Beleza, eu pesquiso!
                  - Tá.
                  - Nossa, uma barata, me dá o veneno aí.
                  - Não tem.
                  - Então vou usar esse livro aqui.
                  Um grito estrondoso ecoou nos tímpanos de nossa heroína .
                  - SOCORRO, ELE VAI ME ACERTAR COM O LIVRO.
                  - Enzo, pare! Acho que você tem razão.
                  - Sempre tenho, mas do que está falando?
                  - Acho que ouvi a barata gritando.
                  - Que?
                  - Não a acerte com o livro.
                  O soar da campainha tilintou por toda casa, aquele som sempre comum a casa, trouxe, dessa vezes, uma visita inesperada. Ao abrir a porta, notei aquela figura pálida em pé a minha frente.
                  - Boa tarde, a vi na escola, mas quem é a senhora?
                  - Sou a professora Nix, substituta da Métis, vim ver como sua filha está.
                  - Fico feliz que alguém da escola tenha vindo saber como ela está, mas bastava um ligação, não precisa se deslocar tanto, não queríamos incomodar, mas é um gesto bonito da escola.
                  - Dandara fez questão de que alguém viesse pessoalmente.
                  - Ela está bem, o médico disse que é uma virose.
                  - Mas o senhor disse que foi um choque contra a parede?
              - Sim, mas acho que ele não entendeu ou não quis me entender, tinha tanta gente.
                  - Entendo, uma pena.
                  - Mas tudo bem, a mãe dela e o avô são os médicos da família.
                  - Dois médicos na família, que bom!
                - É brincadeira, minha esposa é farmacêutica e meu pai e engenheiro agrônomo.
                - Ela eu entendi a ajuda com os remédios, mas  e o avô?
                - Meu  pai sempre foi da filosofia de que, se serve para um animal, então, serve para gente também.
                 - Compreensivo.
                  - Vou chamar a Valentina, aguarde um momentinho, enquanto isso, sinta-se à vontade.
                 Com passos lentos e sóbrios, direcionei-me ao quarto onde estavam as crianças, contudo, não saía da minha cabeça a necessidade de entender o motivo de um membro da escola vir até minha casa, lembro-me, como se fosse ontem, quando, durante duas semanas, na ocasião em que Valentina ainda não completara dois anos de idade, a pequena fora mordida todos os dias, contudo não viera ninguém nos visitar. Bati à porta e entrei no quarto:
                  -  Valentina, sua professora Nix veio de ver.
                  - Sério, pai, já vou.
                  - Estarei na sala com ela esperando por vocês.
                  - Tudo bem, pai.
                 - Ela veio aqui, meu Deus!
                - Calma, Enzo!
                - Calma, ela quando descobriu que eramos primos, queria me interrogar.
                - O que fez?
                - Oras, o que todo homem faria, que pergunta.
                - Você conversou com ela!?
                - Claro que não, saí correndo.
                - Nossa você é muito corajoso!
                - Queira ver se fosse você.
                - Eu falaria normalmente.
                - Sei, assim como é normal ouvir vozes.
                - Vamos lá na sala.
                - Eu não vou.
                - Vamos, Enzo, preciso de você lá.
                - Eu não, vocês vão se entender bem, ela é estranha, você fala com barata, sou o único normal, então, fico aqui.
                - Anda, Enzo.
                - Meu, estou arrependido de ter entrado nessa com você.
                - Para de ser bobo e vamos.
                Os dois foram para sala e lá estava a professora sentada com aquele aspecto sério e de arrepiar.